A vida do apóstolo estava em harmonia com seus ensinos. O amor de
Cristo que ardia em seu coração, induziu-o a empenhar-se em fervorosa e
incansável atividade por seus semelhantes, especialmente por seus irmãos
na igreja cristã.
Cristo ordenara aos primeiros discípulos amarem-se uns aos outros
como Ele os amara. Assim deviam dar testemunho ao mundo de que Cristo
estava formado neles, a esperança da glória. “Um novo mandamento vos
dou”, disse Ele, “que vos ameis uns aos outros”. João 13:34.
Ao tempo em que essas palavras foram pronunciadas, os discípulos não as
puderam compreender; mas depois de haverem testemunhado os sofrimentos
de Cristo, depois de Sua crucificação, ressurreição e ascensão ao Céu, e
após haver o Espírito Santo repousado sobre eles no dia do Pentecostes,
tiveram mais clara compreensão do amor de Deus, e da natureza desse
amor que deviam possuir uns pelos outros. Então, pôde João dizer a seus
companheiros: “Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a Sua vida por
nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos”. 1 João 3:16.
Depois da descida do Espírito Santo, quando os discípulos saíram
para proclamar um Salvador vivo, seu único desejo era a salvação dos
perdidos. Rejubilavam-se na doçura da comunhão com os santos. Eram
ternos, prestativos, abnegados, voluntários em fazer qualquer sacrifício
pelo amor da verdade. Em seu contato diário entre si, revelavam aquele
amor que Cristo lhes ordenara. Por palavras e obras de altruísmo,
procuravam acender esse amor em outros corações.
Um tal amor deviam os crentes sempre acariciar. Deviam viver em
obediência voluntária ao novo mandamento. Tão intimamente tinham de
estar unidos com Cristo a ponto de estar habilitados a cumprir todos os
seus reclamos. Sua vida devia magnificar o poder de um Salvador que
poderia justificá-los por Sua justiça.
Mas gradualmente se operou uma mudança. Os crentes começaram a
olhar os defeitos uns dos outros. Demorando-se sobre os erros, dando
lugar a severo criticismo, perderam de vista o Salvador e Seu amor.
Tornaram-se mais estritos na observância de cerimônias exteriores, mais
rigorosos na teoria que na prática da fé. Em seu zelo para condenar a
outros, passavam por alto os próprios erros. Perderam o amor fraternal
que Cristo lhes ordenara, e, o que é mais triste, não tinham consciência
dessa perda. Não reconheceram que a felicidade e a alegria lhes estavam
abandonando a vida, e que, havendo excluído o amor de Deus do coração,
estariam logo andando em trevas.
João, sentindo que o amor fraternal estava diminuindo na igreja,
insistiu com os crentes sobre a constante necessidade deste amor. Suas
cartas à igreja estão repletas deste pensamento. “Amados, amemo-nos uns
aos outros, porque o amor procede de Deus; e todo aquele que ama é
nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus,
pois Deus é amor. Nisto se manifestou o amor de Deus em nós: em haver
Deus enviado o Seu Filho unigênito ao mundo, para vivermos por meio
dEle. Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas
em que Ele nos amou e enviou o Seu Filho como propiciação pelos nossos
pecados. Amados, se Deus de tal maneira nos amou, devemos nós também
amar uns aos outros”. 1 João 4:7-11.
Sobre o sentido especial em que esse amor deveria ser manifestado
pelos crentes, escreve o apóstolo: “Todavia, vos escrevo novo
mandamento, aquilo que é verdadeiro nele e em vós, porque as trevas se
vão dissipando, e a verdadeira luz já brilha. Aquele que diz estar na
luz e odeia a seu irmão, até agora, está nas trevas. Aquele que ama a
seu irmão permanece na luz, e nele não há nenhum tropeço. Aquele, porém,
que odeia a seu irmão está nas trevas, e anda nas trevas, e não sabe
para onde vai, porque as trevas lhe cegaram os olhos”. 1 João 2:8-11. “Porque esta é a mensagem que ouvimos desde o princípio: que nos amemos uns aos outros”. 1 João 1:5.
“Nós sabemos que já passamos da morte para a vida, porque amamos os
irmãos; aquele que não ama permanece na morte. Todo aquele que odeia a
seu irmão é assassino; ora, vós sabeis que todo assassino não tem a vida
eterna permanente em si. Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a Sua
vida por nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos”. 1 João 3:14-16.
Não é a oposição do mundo o que mais ameaça a igreja de Cristo. É o
mal abrigado no coração dos crentes que acarreta suas mais graves
derrotas, e mais seguramente retarda o progresso da causa de Deus. Não
há maneira mais certa de debilitar a espiritualidade que acariciar a
inveja, a suspeita, a crítica e as vis desconfianças. Por outro lado, o
mais forte testemunho de haver Deus enviado Seu Filho ao mundo é a
existência de harmonia e união entre os homens de variados temperamentos
que compõem Sua igreja. É privilégio dos seguidores de Cristo dar este
testemunho. Mas para isso fazer, precisam colocar-se sob o comando de
Cristo. O caráter deles precisa conformar-se ao Seu caráter, e a vontade
deles à Sua vontade.
“Um novo mandamento vos dou”, disse Cristo, “que vos ameis uns aos
outros; como Eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos
ameis”. João 13:34.
Que maravilhosa afirmação; mas oh! quão pouco praticada! O amor
fraternal está tristemente faltando na igreja de Deus hoje em dia.
Muitos que professam amar o Salvador não se amam uns aos outros. Os
incrédulos estão observando para ver se a fé dos professos cristãos está
exercendo sobre sua vida uma influência santificadora; e eles são
ligeiros em discernir os efeitos no caráter, as incoerências na ação.
Não permitam os cristãos ao inimigo apontá-los e dizer: Vejam como esse
povo, permanecendo sob a bandeira de Cristo odeiam uns aos outros. Os
cristãos são todos membros de uma família, filhos todos do mesmo Pai
celestial, com a mesma bendita esperança da imortalidade. Muito íntimo e
terno deve ser o laço que os une.
O amor divino faz seus mais tocantes apelos ao coração quando
requer que manifestemos a mesma terna compaixão que Cristo manifestou.
Somente o homem que tem no coração amor altruísta por seus irmãos, tem
verdadeiro amor a Deus. O verdadeiro cristão não permitirá
voluntariamente que a pessoa em perigo e necessidade prossiga sem
advertência e sem ajuda. Ele não se esquivará dos que estão em erro,
deixando-os afundarem-se na infelicidade e no desânimo, ou caírem no
campo de batalha de Satanás.
Os que nunca experimentaram o amor terno e cativante de Cristo não
podem guiar outros à fonte da vida. Seu amor no coração é um poder que
constrange e que leva os homens a revelarem-nO na conversação, no
espírito misericordioso e terno, no reerguimento da vida daqueles com
quem se associam. Para ter êxito em seus esforços devem os obreiros
cristãos conhecer a Cristo; e para conhecê-Lo, precisam conhecer Seu
amor. No Céu, sua aptidão como obreiros é medida por sua habilidade em
amar como Cristo amou e trabalhar como Ele trabalhou.
“Não amemos de palavra, nem de língua, mas por obra e em verdade” (1 João 3:18),
escreveu o apóstolo. Atinge-se a plenitude do caráter de Cristo quando o
impulso para auxiliar e abençoar a outros brota constantemente do
íntimo. É a atmosfera desse amor circundando o próprio crente que o
torna um cheiro de vida para vida, e permite que Deus lhe abençoe o
serviço.
Supremo amor por Deus e desinteressado amor mútuo — eis o melhor
dom que nosso Pai celestial pode conceder. Esse amor não é um impulso,
mas um princípio divino, um poder permanente. O coração não consagrado
não o pode criar ou produzir. Ele somente é achado no coração em que
Jesus reina. “Nós O amamos a Ele porque Ele nos amou primeiro”. 1 João 4:19.
No coração renovado pela graça divina, o amor é o princípio que regula a
ação. Ele modifica o caráter, governa os impulsos, controla as paixões e
enobrece as afeições. Esse amor, acariciado no coração, ameniza a vida e
derrama influência enobrecedora ao redor.
João procurou levar os crentes a compreender os elevados
privilégios que lhes adviriam mediante o exercitarem o espírito de amor.
Esse poder redentor, enchendo o coração, controlará todos os outros
motivos, e colocará seus possuidores acima das influências corruptoras
do mundo. E à medida que a esse amor fosse permitido agir amplamente e
tornar-se o motivo impelente na vida, sua esperança e confiança em Deus e
Seu trato para com eles seriam completos. Poderiam, então, vir a Ele em
plena confiança de fé, sabendo que receberiam dEle tudo quanto fosse
necessário para o seu bem presente e eterno. “Nisto é em nós
aperfeiçoado o amor, para que, no dia do juízo, mantenhamos confiança;
pois, segundo Ele é, também nós somos neste mundo. No amor não existe
medo; antes, o perfeito amor lança fora o medo. Ora, o medo produz
tormento; logo, aquele que teme não é aperfeiçoado no amor”. 1 João 4:17, 18.
“E essa é a confiança que temos nEle, que, se pedirmos alguma coisa,
segundo a Sua vontade, Ele nos ouve. E... sabemos que alcançamos as
petições que Lhe fizemos”. 1 João 5:14, 15.
“E, se alguém pecar, temos um advogado para com o Pai, Jesus
Cristo, o justo. E Ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não
somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo”. 1 João 2:1, 2. “Se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo, para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda a injustiça”. 1 João 1:9.
As condições para se alcançar misericórdia de Deus são simples e
razoáveis. O Senhor não requer que façamos alguma coisa penosa para
alcançarmos perdão. Não precisamos fazer longas e exaustivas
peregrinações ou praticar dolorosas penitências para encomendar nossa
alma ao Deus do Céu ou expiar nossa transgressão. Aquele que “confessa e
deixa” os seus pecados “alcançará misericórdia”. Provérbios 28:13.
Nos tribunais do Céu, Cristo está a interceder por Sua igreja —
advogando a causa daqueles cujo preço de redenção Ele pagou com o Seu
próprio sangue. Séculos e eras nunca poderão diminuir a eficácia de Seu
sacrifício expiatório. Nem a morte, nem a vida, altura ou profundidade,
nada nos poderá separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus; não
porque a Ele nos apeguemos com firmeza, mas porque Ele nos segura com
Sua forte mão. Se nossa salvação dependesse de nossos próprios esforços
não nos poderíamos salvar; mas ela depende de Alguém que está por trás
de todas as promessas. Nosso apego a Ele pode ser débil, mas Seu amor é
como de um irmão mais velho; enquanto nos mantivermos em união com Ele,
ninguém nos poderá arrancar de Sua mão.
Enquanto os anos passavam e o número dos crentes aumentava, João
trabalhava pelos irmãos com crescente fidelidade e devotamento. Os
tempos eram cheios de perigo para a igreja. Enganos satânicos existiam
por toda parte. Por meio de adulteração e falsificação os emissários de
Satanás buscavam suscitar oposição às doutrinas de Cristo; e como
conseqüência disso, dissensões e heresias estavam pondo em perigo a
igreja. Alguns que professavam a Cristo pretendiam que Seu amor os havia
libertado da obediência à lei de Deus. Por outro lado, muitos ensinavam
que era necessário observar as cerimônias e os costumes judaicos; que a
mera observância da lei, sem fé no sangue de Cristo, era suficiente
para a salvação. Outros sustentavam que Cristo fora um homem bom, mas
negavam Sua divindade. Alguns que simulavam ser leais à causa de Deus
eram enganadores e, na prática, negavam a Cristo e Seu evangelho.
Vivendo eles mesmos em transgressão, introduziam heresias na igreja.
Muitos eram assim levados a um labirinto de ceticismo e engano.
João enchia-se de tristeza ao ver surgirem na igreja esses
venenosos erros. Viu os perigos a que a igreja seria exposta, e
enfrentou a emergência com prontidão e decisão. As epístolas de João
respiram o espírito de amor. É assim como se ele escrevesse com a tinta
do amor. Mas quando entrou em contato com os que estavam a quebrar a lei
de Deus, embora declarando estar vivendo sem pecado, não hesitou em
adverti-los de seu perigoso engano.
Escrevendo a uma auxiliar na obra do evangelho, uma mulher de boa
reputação e grande influência, disse ele: “Já muitos enganadores
entraram no mundo, os quais não confessam que Jesus Cristo veio em
carne. Este tal é o enganador e o anticristo. Olhai por vós mesmos, para
que não percamos o que temos ganhado; antes, recebamos o inteiro
galardão. Todo aquele que prevarica e não persevera na doutrina de
Cristo não tem a Deus; quem persevera na doutrina de Cristo, esse tem
tanto o Pai como o Filho. Se alguém vem ter convosco e não traz essa
doutrina, não o recebais em casa, nem tampouco o saudeis. Porque quem o
saúda tem parte nas suas más obras”. 2 João 1:7-11.
Estamos autorizados a ter na mesma consideração indicada pelo
discípulo amado os que alegam permanecer em Cristo ao mesmo tempo que
vivem em transgressão da lei de Deus. Existem nestes últimos dias males
semelhantes àqueles que ameaçavam a prosperidade da igreja primitiva; e
os ensinos do apóstolo João sobre estes pontos deveriam ser
cuidadosamente considerados. “Necessitais mostrar amor”, é o clamor que
se ouve em todos os lugares, principalmente da parte daqueles que
professam santificação. Mas o verdadeiro amor é demasiado puro para
acobertar um pecado não confessado. Conquanto devamos amar as pessoas
por quem Cristo morreu, não nos devemos comprometer com o mal. Não
podemos nos unir aos rebeldes e chamar a isso amor. Deus requer de Seu
povo nesta fase do mundo que permaneça firme pelo direito, tanto quanto
João em oposição aos erros que arruínam as pessoas.
O apóstolo ensina que embora devamos manifestar cortesia cristã,
estamos autorizados a tratar em termos claros com o pecado e os
pecadores; que isso não está em desarmonia com o verdadeiro amor.
“Qualquer que comete pecado”, escreveu ele, “também comete iniqüidade;
porque o pecado é iniqüidade. E bem sabeis que Ele Se manifestou para
tirar os nossos pecados; e nEle não há pecado. Qualquer que permanece
nEle não peca; qualquer que peca não O viu nem O conheceu”. 1 João 3:4-6.
Como testemunha de Cristo, João não se empenhou em controvérsia
nem em debates inúteis. Declarou o que sabia, o que tinha visto e
ouvido. Havia estado intimamente relacionado com Cristo, tinha-Lhe
ouvido os ensinos, testemunhado Seus poderosos milagres. Poucos puderam,
como João, ver as belezas do caráter de Cristo. Para ele, as trevas
tinham passado; brilhava a verdadeira luz. Seu testemunho com respeito à
vida e morte do Salvador era claro e penetrante. Da abundância que
havia no coração brotava o amor pelo Salvador enquanto ele falava; e
poder algum lhe podia impedir as palavras.
“O que era desde o princípio”, declarou, “o que ouvimos, o que
vimos com os nossos olhos, o que temos contemplado, e as nossas mãos
tocaram da Palavra da vida; [...] o que vimos e ouvimos, isso vos
anunciamos, para que também tenhais comunhão conosco; e a nossa comunhão
é com o Pai, e com Seu Filho Jesus Cristo”. 1 João 1:1, 3.
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